O microfone revoltado

Acompanhe a saga do microfone que decidiu falar em pleno culto do que via e ninguém pode contradizê-lo!

O culto tinha tudo para ser bonito. Igreja cheia, orgãos lotados. Era festa. Fardamento novo, reluzente, muitos convidados. O pastor havia preparado um sermão especial. O tema era convidativo. Podíamos esperar encher os olhos. O maestro repassava os hinos do devocional, aguardando ansiosamente ser chamado pelo dirigente. Os minutos eram seguidos com ansiedade… 18:50, 18:51, 18:52… Todos na expectativa. Tanto o pastor, quanto o dirigente se entreolham de modo frenético.

Com as sete badaladas, ponteiros aprumados, o dirigente se empertiga, ajeita o paletó e segue sobranceiro em direção ao microfone. O sonoplasta se certifica que esteja ligado e regulado na altura certa. Olha uma segunda vez para a mesa de som. Está tudo ok.

Mas há um problema: não sai som. O dirigente olha com ar de interrogação para o sonoplasta, que desconecta e reconecta o cabo. Nada. Ele sai da cabine e se acerca do microfone. Faz o mesmo processo do lado de cá: desconecta e reconecta, na esperança que vá resolver. Dá aquela batidinha característica, se ouve um som agradável e razoável. Recoloca no pedestal e dá as costas para o púlpito, indo em direção à sua cabine.

Mal dá o primeiro passo, nada de som. O dirigente se impacienta. Foram embora preciosos minutos. O sonoplasta refaz o processo, tudo aparenta está ok. O dirigente vai esperançoso falar, nada se ouve. Após alguns segundos de hesitação o microfone se põe a falar sozinho:

– Paz do Senhor!?

– Vocês devem estar perguntando quem está falando? Sim, sou eu mesmo: o microfone!

A multidão começa a sussurrar alguma coisa incrédula. O dirigente olha para o pastor e daí para a audiência… O microfone continua.

– Eu decidi não funcionar hoje para poder dizer algumas coisas a vocês…

O burburinho diminui… Todos querem ouvir.

– Eu já ouvi e vi muita coisa daqui, sempre calado. De tanto ouvir a Bíblia comecei a memorizar os versículos e as pregações. Como daqui dá pra ler os textos, nas horas vagas comecei a comparar e há muitas mentiras ditas me utilizando…

O burburinho cresceu. Podia-se ouvir mais de um: “Uau!”

– Além das muitas mentiras sobre Deus e sua Palavra, ouço também muita bravata. Muita teoria e pouca prática. É gente que cita o Salmo 133, enquanto briga com o irmão bem antes de descer do púlpito. Outros que dizem vá, ide, fazei, quando não vão a lugar algum. Muitos discursos vazios…

O dirigente interrompe:

– Acho que o microfone está nervoso…

– Não, não é isso – retruca o microfone. – Veja essa multidão aí, quem veio realmente adorar? Fico num lugar alto e daqui dá pra ver todo mundo. Gente mascando chiclete, olhando para o vestido das outras pessoas que chegam, sorrindo como se estivesse num circo. Vejo muita gente olhando para o relógio, especialmente, perto do fim do culto…

Um silêncio sepulcral se impôs.

– São tantas bocas aqui que aprendi leitura labial. Por isso mesmo passo mal todo culto ao olhar aqui e acolá e entender o que estão conversando: Pouca coisa sobre adoração, sobre Cristo, sobre santidade! Vocês não notam minha tristeza porque eu sou magrinho e meu amigo pedestal disfarça com seus braços erguidos.

Todos estavam pertrificados.

– Outra coisa: aqui se grita muito. Faço radiografia de pulmões todos os dias. Gente do céu, como vocês gritam!

O dirigente interrompe:

– Irmãos, vamos orar porque só pode ser o cão!

O microfone devolve:

– Oops! Pode parar. Nada de cão, assuma sua parte. Agora há pouco você estava falando de outro irmão para o pastor. Um pouco antes fazia chacota do paletó barato do presbítero. Você estava sentado e fazendo seus trejeitos e eu lendo seus lábios.

O dirigente baixou a cabeça e começou a chorar. O pastor veio em seu socorro. O microfone continuou:

– Tem mais uma coisa. Hoje não funciono, cansei de tanta impostação! Fiquem na paz!

E se calou. O culto mudou de tom. Podíamos ver um ou outro chorando. A igreja começou a cantar um hino sem o maestro. Uma sensação de paz e humildade veio aos corações.

O culto foi uma benção…

Sobre o autor | Website

Meu nome é Daladier Lima dos Santos, nasci em 27/04/1970. Sou pastor assembleiano da AD Seara/PE. Profissionalmente, trabalho com Tecnologia da Informação, desde 1991. Sou casado com Eúde e tenho duas filhas, Ellen e Nicolly.

Insira seu e-mail aqui e receba as atualizações do blog assim que lançadas!

100% livre de spam.

Para enviar seu comentário, preencha os campos abaixo:

Deixe uma resposta

3 Comentários

  1. chenval disse:

    Veja como ficou o site da nova convenção CADB: http://portalcadb.com/inicio/, uma maravilha.

    Att: Chenval

  2. Felipe Andre Ferreira da Silva disse:

    Nobre Pastor, Excelente texto! Ou melhor, Metáfofora!
    Quem dera que outros tantos microfones se revoltassem, só assim teríamos adoradores em excelência, aprouve Deus voltemos aos primórdios de respeito ao sacro(santo), pois precisamos readquirir o respeito aos utensílios que foram um dia consagrados ao SENHOR. Todavia, a começar é claro, por nossas vidas.

    Em Cristos, Sola Gratia.
    Felipe Andre, seu conservo.

  3. Williane Costa disse:

    Ótimo.
    Como seria maravilhoso, se esse microfone ficasse na dele a maioria das vezes.
    O que realmente deve acontecer é a reverência na casa de Deus. Infelizmente isso tá longe de vermos.